Com a internação do presidente Jair Bolsonaro nesta quarta-feira e o vice-presidente Hamilton Mourão fora do país para a cúpula da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), a linha sucessória diz que a cadeira da presidência da República deve ser ocupada pelo presidente da Câmara dos Deputados. Há, no entanto, um impasse jurídico no Supremo Tribunal Federal (STF) a respeito da possibilidade de o atual presidente da Casa, deputado Arthur Lira (PP-AL), assumir a cadeira, que poderá ter que ser debatido diante do atual cenário.
Segundo fontes do STF ouvidas pelo GLOBO, a tendência hoje na corte é adotar um posicionamento favorável à possibilidade de Lira assumir a Presidência da República.
O impasse diz respeito a um entendimento adotado pelo próprio Supremo, em 2016, sobre o então presidente do Senado Renan Calheiros (MDB-AL). O plenário, por maioria, validou liminar para dizer que réus em ações penais no STF não podem substituir o presidente e o vice caso os dois se ausentem do país, ainda que estejam liberados para comandar as duas Casas Legislativas federais.
A situação de Lira gera dúvida por que em outubro de 2019, a Primeira Turma do STF recebeu uma denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) que acusa o deputado e aliado do governo Bolsonaro de aceitar propina de R$ 106 mil do então presidente da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), Francisco Colombo, em troca de mantê-lo no cargo. A defesa de Lira recorreu.
Ministros ouvidos pelo GLOBO avaliam que, embora a denúncia tenha sido recebida, como o recurso da defesa ainda está pendente de julgamento, o presidente da Câmara não virou réu efetivamente – Lira, portanto, estaria apto a assumir a presidência. Uma outra ala de ministros entende, porém, que a partir do recebimento da denúncia o acusado torna-se réu, havendo o impedimento para que o deputado assuma a presidência.
Na Corte, internamente, há a avaliação de que, caso Lira venha a assumir, o questionamento a respeito da possibilidade de que o deputado assuma será feito. Quando isso ocorrer, o plenário terá que se manifestar sobre o assunto. Caso a ação chegue ao STF durante o recesso, com pedido de liminar, a decisão caberá ou ao presidente da Corte, ministro Luiz Fux, ou à vice-presidente, ministra Rosa Weber, que assume o plantão já na semana que vem.
Ao GLOBO, a defesa de Lira sustenta que o presidente da Câmara não se torna réu até que a a Primeira Turma conclua a análise dos embargos de declaração, paralisada em novembro de 2020 por um pedido de vista do ministro Dias Toffoli. “O presidente da Câmara está em plenas condições de assumir a cadeira caso seja necessário”, afirmou o advogado Pierpaolo Bottini.
Embora o Supremo tenha decidido em 2016 sobre a situação de Renan Calheiros, ainda está pendente de conclusão a análise sobre o mérito da questão. Em 2017, um pedido de vista do ministro Gilmar Mendes adiou a conclusão do julgamento da ação que discute se réus em ação penal perante o STF podem ou não substituir presidente da República. Quando o julgamento foi paralisado, já havia maioria para dizer que réus perante o STF não podem ocupar cargos que estão na linha de substituição da Presidência da República, mas conservam a titularidade de presidentes das suas respectivas Casas.
Caso Lira seja impedido de assumir, o próximo na linha sucessória é o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que não é réu em ações penais. Com isso, ele ficaria livre para assumir o cargo temporariamente.